Exercício tem mais poder contra a depressão do que se sabia, diz estudo

Um dos benefícios da prática de atividades físicas no combate às doenças mentais é a liberação de substâncias como a endorfina, que causam uma sensação de bem-estar. Um novo estudo publicado na revista científica frontiers of Psychology aponta que os ganhos podem ir além.

Os exercícios podem alterar padrões do cérebro e, assim, reduzir os sintomas da depressão, de acordo com testes conduzidos por pesquisadores da University Clinic for Psychiatry and Psychotherapy at Ruhr-Universität Bochum (RUB), na Alemanha.

“Há muitos estudos que relacionam a atividade com a melhora o humor, mas esse material busca se o exercício também é capaz de aumentar as conexões entre os neurônios – as chamadas sinapses – e a sua plasticidade, que é capacidade de mudança do cérebro”, afirma o neurocirurgião Marcelo Valadares, pesquisador da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O desenvolvimento dessas duas funções melhora a capacidade de aprendizado e de adaptação, importantes para combater a perda de interesse por atividades básicas e motivação, principais indícios da depressão.

Os estudos foram conduzidos com 41 pessoas que se internaram em um hospital para fazer parte do estudo. Um dos exames utilizados foi a estimulação magnética craniana. “O aparelho ativa os neurônios e avalia quais áreas dão melhor resposta”, explica Valadares.

O início e a escolha do tipo de exercício deve ser avaliado com a ajuda de médicos e educadores físicos. “É muito difícil conseguir que alguém com depressão grave tenha práticas regulares, antes do tratamento. Casos moderados e leves também devem utilizar a atividade em parceria com a psicoterapia e medicamentos indicados pelo psiquiatra, quando necessários”, defende o neurologista.

Como dar o primeiro passo

Movimentar-se hoje já é visto como parte do processo de cura, segundo diretora Monica Marques, diretora técnica da Cia. Athletica, em São Paulo, e membro do Global Health and Fitness Association (IHRSA). “Não é mais complemento, é parte do tratamento. Muitos alunos chegam com indicação de seus médicos”, afirma a professora.

Antes de tudo, é preciso lembrar que a depressão tem diversos níveis e causas, e a atividade física deve estar alinhada a essas questões. “Os transtornos psicológicos podem vir do estresse, de alterações hormonais, traumas, consumo de álcool ou drogas. Essa escolha precisa ser multidisciplinar, acompanhada, muitas vezes, de terapia e medicamentos”, reforça a educadora física.

Quanto mais apurado o diagnóstico, melhores serão as decisões. “Quem está muito estressado ou ansioso começa com exercícios de relaxamento, como yoga ou meditação, porque muda o padrão respiratório. A natação é outra opção porque obriga a pessoa a manter o ritmo a cada braçada”, explica Monica.

Comum durante a pandemia do coronavírus, a depressão por luto ou isolamento social tem como aliado os exercícios que estimulam a produção da ocitocina, o “hormônio do abraço”. “Práticas coletivas e com música, principalmente, dão essa sensação de acolhimento, como a dança e a hidroginástica”, conta a diretora da Cia. Athletica.

Caminhar, correr, pedalar e nadar também são atividades cardiorrespiratórias que ajudam no combate à insônia, perda de memória e ganho de peso corporal, mais comuns na depressão causada por fatores hormonais. Quem está pronto para apertar o passo ou intensificar o ritmo, no entanto, precisa antes passar para um cardiologista. “É necessário verificar antes como está a saúde”, lembra Valadares.

Menos obrigação e mais recompensa

Tirar a pressão do exercício físico é importante para estimular quem está deprimido. Cada novo passo que se dá é importante para a evolução do tratamento.

“No estudo esse período foi curto, de três semanas, mas é importante saber que para experimentar aquele bem-estar da atividade é preciso correr ao menos 20 minutos. Só que é preciso treinar muito antes para chegar nesse tempo”, explica o psquiatra e nutrológo, Frederico Porto, de Belo Horizonte.

Antes de pensar nesse resultado, o importante é focar na consistência. Fazer 15 minutos por dia de exercício é melhor do que duas horas uma vez por semana. E essa recorrência que ajuda a mudar um hábito. Se a pessoa pula direto para duas horas de academia, ela vai desistir e voltar para a rotina sedentária porque a prática será vista como uma punição.

“O nosso corpo é desenhado para conservar energia. Qualquer pessoa que vai começar uma atividade sentirá primeiro a fadiga subjetiva, que é cérebro dizendo que ele quer se preservar. Quem é corredor já sabe que ela virá, insiste no exercício até que o cansaço passa. Fazendo mudanças graduais é uma forma de ‘enganar’ esse sistema”, explica Porto.

Monica Marques diz que é uma tendência tirar essa pressão por resultados rápidos justamente para estimular a prática.

“Há uma campanha da OMS [Organização Mundial da Saúde] chamada ‘Every Move Counts’ [Todo Movimento Conta], que é justamente para desconstruir a ideia de que a pessoa só terá bons resultados se cumprir a meta dos 150 minutos de exercícios semanais. Ganhar massa muscular e emagrecer não é mais importante do que manter uma boa saúde mental e emocional”, completa a professora.

Facilitar e flexibilizar a prática são outros pontos fundamentais. “Se você quer tomar dois litros de água por dia, precisa ter uma garrafa perto de você. Para caminhar todos os dias, você pode ir à tarde ou à noite se falhou pela manhã. E não adianta se matricular em uma aula presencial do outro lado da cidade”, defende Porto.

Outro mito sobre mudança de hábito é o fato de um nova rotina se estabelece após 21 dias consecutivos. “Essa ideia nasceu do livro ‘Psicocibernética’, do cirurgião plástico Maxwell Maltz. Ele descobriu que uma pessoa que perde um membro demora 21 dias para perceber a falta dele, e concluiu que todos os outros comportamentos se baseiam nesse prazo”, explica o psquiatra.

O livro é dos anos 1960, e uma metanálise inglesa publicada em 2009 no European Journal of Social Psycology concluiu que um hábito demora em média 66 dias para ser criado.

 

Fonte: Veja

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